A sensação de estar marcado para sempre

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É engraçado como memórias nos pegam de surpresa. Coisas que poderiam estar perdidas dentro de nós, se não fosse por um acaso do destino que faz com que momentos marcantes da sua vida aconteçam em anos diferentes, mas com a mesma data. Porque aqui estava eu, mais um dia dos namorados, nada de diferente. Um dia em que eu não poderia esperar menos do que nada, mas que no fim acabou com uma tatuagem em meu corpo. E, dessa vez, eu não estava marcado apenas emocionalmente, havia algo de real e concreto como um membro do meu corpo.

Em 12 de junho de 2016, as marcas eram de uma ruína interna. Era a dor de perder aquele que você considerava o amor da sua vida para alguém que te chamava de melhor amigo. E tudo bem ali, na sua frente, a pontada inicial do rompimento do seu coração. Seu primeiro coração partido é algo que, talvez, você nunca esqueça, em parte porque foi a primeira vez que você se sentiu traído, trocado ou insuficiente e, por outro lado, a primeira vez em que você experimenta o lado ruim do amor. Era o seu primeiro amor, afinal.

Que ironia perder o “amor de sua vida” em pleno dia dos namorados, que infortúnio! Mas o que me peguei pesando mesmo – dois anos depois – foi no que resultou de tudo isso. Em todo o caminho percorrido em busca de si mesmo, e em tudo o que ficou para trás, e em todo o espaço que se abriu para que coisas novas viessem. E elas vieram, sem aviso, sem se identificar, apenas chegaram e me invadiram como o sol adentra uma casa de janelas abertas.

Acredito que da mesma forma que você fica vulnerável quando o amor te encontra, você deve ficar do mesmo jeito para que a cura venha. Às vezes, nos prendemos a ideia de que se enclausurar é a resposta pra tudo, quando na verdade, o melhor é deixar que as coisas circulem. Nem prender e nem soltar, apenas deixar ir e tomar o rumo que deve tomar. Tudo nessa vida merece um destino orgânico. E que parte sua merece tanta atenção quanto um coração, que de tão preciso carrega a ironia e o poder de manter a vida e também de tirará-la. E, na pior das hipóteses, te mantém meio morto, meio vivo.

Foi como eu me senti pelos meses que vieram depois de junho. Mas em fevereiro de 2017, um livro chamado Milk and Honey veio parar em minhas mãos, e aquilo funcionou como um portal. Foi como se eu tivesse atravessado a mim mesmo, deixando quem eu costumava ser em um ponta e abraçando quem eu seria daqui para frente na outra. Eu tinha finalizado a travessia de uma das pontes mais dificeis que a vida colocou em meu caminho. Mas é engraçado como as coisas são, porque da mesma forma que você vai parar no lugar errado na hora errada, a coisa certa também pode vir junto.

Enquanto eu lia o livro da Rupi Kaur, eu me sentia uma semente esperando por água, e a cada poema eu fui me sentindo mais e mais regado, à medida em que me tornava mais forte para atravessar o solo. E foi o que aconteceu ao final da leitura: desabrochei. E também foi isso que aconteceu: havia o desenho de uma flor na última página do livro, e foi ali que eu soube que aquela seria minha primeira tatuagem. Porque aquela flor representava quem eu era e quem eu me transformei.

E foi até estranho olhar para trás depois de tanto tempo, porque agora nem parece que um dia eu fui aquela pessoa de dois anos atrás. Em 12 de junho de 2018, a vida não está exatamente a mais fácil, mas pelo menos não há coração partido, e todas as dores que venho sentindo parecem, de certa forma, suportáveis. Agora, não é mais como se eu fosse alguém incapaz, parece que mais do que apenas entendi o que é ser forte, eu me senti forte. Me sinto forte.

Nunca pensei que viveria momentos tão diferentes da minha vida em uma mesma data. Então é verdade o que uma garota uma vez me disse, há beleza na ruína, e uma flor desabrochou no meio dela. E essa flor é mais que o desenho de uma mulher que admiro, ou uma tatuagem em meu corpo que ficará em mim para sempre. Essa flor sou eu. A vida muda, queridos, e, às vezes, a gente nem nota. Apenas sentimos, e quando nos damos conta, já somos a pessoa que queremos ser e nem a apreciamos, porque sempre estamos ocupados querendo mudar.

Então, o que fiz hoje foi deixar que me marcassem, o que até doeu um pouco, mas doeu bem menos que dois anos atrás. Deixei que me marcassem para que, a partir de agora, eu lembre que posso até não ser bem tudo o que quero ser, mas que um dia fui menos, e que, por hora, sou tudo o que preciso ser. Suficiente para mim, suficiente para a vida, suficiente para florescer. Mesmo que não seja fácil, mesmo que leve mais dois anos para que eu atravesse o solo de novo.

 

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